Definitivamente, hoje apetece-me entrar num aquário e submergir. Num aquário de água morna. E que me cresçam guelras, já agora, porque sou pouco dada a água no nariz.
Se não estou rodeada de gente maluca, então sou mesmo eu.
Há meses, anos, que estendo a mão, o ombro os braços, (embora só me apeteça estender o pé ) para ajudar a sogra, que está maluca de todo!! Sindroma demencial, é o nome técnico do neurologista. Depressão e comportamento compulsivo, acrescenta o psiquiatra. Birra, chama-lhe a cunhada. Eu faço a minha aposta no Alzeihmer que nenhum médico ainda confirmou, mas que as consultas de neurologia das próximas 6ª e 2ª feira não deverão excluir. As manias, os choros, os fingimentos, a birrinhas, as manobras, os chiliques, a gaguez, tudo lhe aparo, porque sei que está doente, mas estão a dar comigo em maluca. A pressão para mudarmos lá para casa é enorme. Mas daqui não leva nada sogra.
O sogro, de quem tanto gosto, surdo de todo, a fazer confusões, e a pressionar para mudarmos para a casa penhorada da prima, mesmo ali ao pé. Ele diz que empresta dinheiro. Dinheiro que não temos como pagar. Casa que me incomoda moralmente, por ser a casa dos primos das minhas filhas. Casa que, sendo bom, não está nem perto do que eu gostava ou precisaria numa casa. Sogro com dinheiro e vida confortável que se chora diariamente da pobreza...sogro que prefere continuar surdo e a gritar, do que por um aparelho para ouvir melhor. E, acima de tudo, ouvir o que lhe dizem, e não o que ele imagina ouvir das palavras que entende mal.
A mãe. Com 62 anos, cansada, estourada, com o cérebro em papas de anos de ginástica a contar tostões na empresa e em casa. Com a ideia de que quem não é por ela, é automáticamente contra ela. Traumatizada com o internamento na casa de freias, torturada de ciúmes da irmã, perseguida pelo fantasma dela, esteja presente ou não, ( não é uma santa, a minha tia), esmagada por um pai que não terá sido assim tão mau, arrastada por anos de cuidados aos pais, aos filhos e netas. Que está a ficar louca, que vive de conjecturas do que alguém pode ouvir, do que as irmã e cunhados poderão, fazer, dizer, ter, viver, comprar, vender, entrar ,sair, cagar...e sempre a lembrar-me que eu sou gorda, e que um dia lhe disse que nunca ficaria gorda como ela e fiquei pior, e que um dia eu vou ser pior que ela, e que ninguém vai tomar conta de mim, e que eu vou estar mais doente que ela, mais pobre que elas mais tudo de mau do que ela...enquanto eu tento engolir, não lhe responder mal, e não deixar de por os pès naquela casa. Mas não esqueço. Arrumo num canto, e perdoo-o porque é a minha mãe, e mais dia, menos dia, terei de cuidar dela, sem a abandonar. Porque devo, e porque não vejo outra maneira de um filho tratar os pais.
O pai, que quando se puder reformar terá 50 anos de descontos, e três anos de guerra, e estará cansado e desgastado demais para aproveitar. E viverá obcecado pela bula dos remédios...
A irmã a seguir,advogada, que anda desaparecida, misteriosa, deixou quase todo o trabalho. Preocupo-me com as cartas que chegam e ela não abre, não faz, os clientes que perderam o apoio. Preocupo-me ainda mais com o que não me é dito, e com a fragilidade que ela esconde mas eu sei que ela tem
Com a irmã seguinte, psicologa, que anda com cara demasiado alegre, aquela que usa para camuflar o que corre mal, e que só se sabe sempre muito tempo depois...aquela que se ri, e me dá razão sobre a mãe: eu para a semana que vem vou com ela ao psiquiatra...
O irmão, estudante, e a sua namorada, os sem expectativas, os sem um tostão, os eternos garotos...o que será deles?
O marido. O homem que eu tanto AMO, mas onde vou notando comportamentos obcessivos e a intolerância à migalha no chão, à louça suja, à bancada molhada. A critica na ponta da lingua a como lavo, seco, passo, varro, ando, como, visto...tudo está mal ( valha-me o sexo, ainda não se queixa)...vou deixando para segundo plano. As prioridades desreguladas: o que interessa tirar a louça da máquina e arrumar no armário quando estamos super atrasados pela manhã, as filhas estão por vestir, os pequenos almoços por fazer? Pelos vistos tem o maior dos interesses!! Mas essa crítica fácil não se aplica no trabalho, que o tem arrasado há meses, e onde não tem tomates para por os pontos nos iiis. Porque tem sobre os ombros o peso da subsistência da nossa família. E por isso, tudo lhe desculpo. Mas não esqueço, nem deixo de ser eu.
As filhas, que não tiram a palavra mãe da boca, para tudo, e para nada, que se preocupam e me ocupam com birras de roupa, birras de cama, o casaco que não fica bem, a camisola interior que se vê na gola, as calças que não têm brilhante, o casaco que está a ficar curto.
Foda-se. Estou pelos cabelos!
E pendurada pelo pescoço por uma trabalho que não tem grandes prespectivas, que não me dá o dinheiro que eu precisaria.
E amocho.
Por isso, hoje quero submergir, e não ouvir mais nada de ninguém. Só por umas horas, ao menos.
É que, se não são os outros, que pelos vistos se sentem todos muito bem, a maluca sou eu, e para bem da humanidade, devo ser isolada.